Tensão global: até que ponto o tarifaço norte-americano pode afetar a economia de Cachoeira do Sul através da orizicultura? / Foto: Aires Carmen/Divulgação/EPAGRI
A decisão do governo dos Estados Unidos de impor o tarifaço de 50% sobre as importações de arroz brasileiro, anunciada pelo presidente Donald Trump e em vigor desde a última quarta-feira (6), pode desencadear efeitos significativos em Cachoeira do Sul sob a perspectiva da orizicultura, pelo fato de Cachoeira do Sul ser um dos principais polos de produção de arroz irrigado do Brasil.
Segundo a Associação Brasileira da Indústria do Arroz (Abiarroz), o impacto do tarifaço no mercado nacional pode chegar a US$ 25 milhões por ano em perdas para a indústria. Embora o cálculo não seja detalhado por município, uma projeção proporcional baseada no peso de Cachoeira do Sul na produção gaúcha indica que o município poderia registrar um prejuízo direto de cerca de US$ 760 mil anuais no pior cenário, embora, verdade seja dita, a Capital do Arroz não seja exatamente um polo de beneficiamento e mande a maior parte de sua produção in natura para além dos limites de sua área territorial.
O peso estratégico de Cachoeira do Sul no arroz brasileiro
Com uma safra recente estimada em 218 mil toneladas, Cachoeira do Sul integra o núcleo duro da orizicultura gaúcha, setor que concentra aproximadamente 70% de toda a produção nacional. No caso específico do arroz beneficiado – o grão já processado e de maior valor agregado – o mercado norte-americano vinha se consolidando como destino estratégico, absorvendo parte significativa do produto premium brasileiro.
Nos últimos três anos, as exportações dessa variedade para os EUA cresceram mais de 50%. Em 2024, o país foi responsável por 13% do valor total exportado de arroz branco pelo Brasil.
Tarifaço traz risco de excedentes e pressão sobre preços internos
Com a barreira imposta pelo tarifaço, a competitividade do arroz brasileiro nos EUA praticamente desaparece. Para Cachoeira do Sul, isso significa que parte da produção que hoje é direcionada ao mercado externo pode acabar ficando no país, elevando os estoques e pressionando para baixo os preços pagos aos produtores.
A lógica é clara: mais oferta interna sem aumento correspondente da demanda tende a derrubar as cotações. “Enquanto os Estados Unidos têm facilidade para encontrar outros fornecedores, para nós esse mercado é estratégico para escoar cerca de 10% do arroz beneficiado produzido no país”, alertou a Abiarroz.
Impacto do tarifaço na economia local
O setor arrozeiro movimenta não apenas as lavouras, mas uma cadeia inteira em Cachoeira do Sul e fora de seus limites, como beneficiadoras, transportadoras, cooperativas, fornecedores de insumos e prestadores de serviços especializados. Uma queda prolongada na rentabilidade pode reduzir investimentos, comprometer empregos sazonais e diminuir a circulação de renda e dinheiro novo no município.
Além disso, a necessidade de armazenar volumes maiores implicará custos adicionais para indústrias e cooperativas, que terão de buscar espaço e capital de giro para manter a operação até encontrar novos compradores. Especialistas defendem que, diante desse novo cenário, o setor busque diversificar destinos comerciais, mirando mercados na América Latina, África e Oriente Médio.
Apostar em qualidade e certificações pode ajudar a reduzir a dependência de competir apenas por preço. Também é vista como essencial a articulação entre produtores, cooperativas e poder público para viabilizar linhas de crédito emergenciais, incentivar a comercialização externa e fortalecer a imagem do arroz gaúcho como produto premium.
Um teste para a resiliência da orizicultura
Cachoeira do Sul já enfrentou desafios climáticos e de mercado ao longo das últimas décadas, mas a barreira tarifária imposta por Washington impõe um teste de natureza distinta: a adaptação rápida a um cenário em que um dos principais compradores se torna, de repente, economicamente inviável.
Se o setor conseguirá se reinventar diante do tarifaço imposto pelo presidente americano Donald Trump, ainda é cedo para fazer qualquer afirmação. No entanto, uma coisa é acerta: é preciso buscar novos caminhos para escoar a produção e evitar que a cidade sinta, em cheio, os efeitos do protecionismo norte-americano.